Últimmas Folhas

23 de abril de 2009

Inexplicável

INEXPLICÁVEIS
Para Débora

Todo dia tem uma noite:
Pra quê o dia insiste em nascer?

Então, pra quê?

Toda música tem um refrão:
pra quê a música insiste em tocar?
Uma hora o vinil acaba:
tenho ou não tenho razão?

Toda tristeza é um vício:
pra quê insiste em voltar?
Um dia ela pára:
todo mundo sabe disso...

15 de abril de 2009

Fingimento

FINGIMENTO (06/abr/2009)

Finjo que não sei
que faço fragmento,
que penso fragmento,
que sou fragmento,
que o que sinto... é fingimento.

13 de abril de 2009

Imperativo

Mundo Imperativo
e pouco tempo para pensar

por isso compro:
porque me completa.

Naqueles dias sozinhos,

Naqueles dias sozinhos, sempre colocava o livro de lado, apoiava o queixo numa mão e olhava, ponderando as coisas do mundo, a paisagem da varanda. Ficava ali, em repouso e em silêncio; imóvel. Todo o barulho que ouvia vinha do mundo lá fora. E lá ficava, pensando, à espera.

Sempre esperando que alguém abrisse a porta que nunca era trancada e entrasse em sua casa, para encontrar ali a pessoa imóvel e vulnerável na cadeira de embalo. Chegasse e surpreendesse sua taciturnidade. E perguntasse:

– O que você está fazendo?

Fazia isso em todo dia de silêncio.

Mas a porta jamais era aberta.

11 de abril de 2009

sem título

O sentimento que eu tinha foi
embora
e o lugar que ele
deixou
enchi de lágrimas

8 de abril de 2009

O Retrato de Edward (Pt. 2)

Dois dias atrás, Mariana não conhecia Edward. Ela nem sequer desconfiava que iria se apaixonar por um retrado de um lorde inglês que um estranho lhe dera no ônibus. Mas aconteceu.

Dois dias atrás, ela estava passando tranqüilamente pela Rua do Hospício, em direção à Av. Conde da Boa Vista, pronta para pegar seu ônibus e ir para casa. Dois dias atrás não haveria trânsito por causa de protestos.

Dois dias atrás, aquele rapaz estranho e sóbrio que havia-se sentando ao lado de Mariana no ônibus estava perdido na cidade, do outro lado do rio.

Fernando não era do tipo farreiro. Gostava dumas cervejinhas aqui e ali, mas nem perto do tipo farreiro. Pelo menos não como seus amigos. E que sua mãe jamais soubesse quem eram seus amigos.

Logo, ele não entendia como havia parado na Rua da Moeda. Numa quarta-feira. À tarde. É, não tinha o menor sentido. Mas se ele fosse procurar sentido em tudo, acabaria louco. Ou filósofo, o que era pior ainda.

Então, não se incomodou com isso, apenas seguiu seu caminho, tentando achar a bendita da Rua da Imperatriz. Tinha a impressão de que havia errado feio o caminho dessa vez. Pudera, nunca andava pelo Centro, nem pelo Recife Antigo.

Havia chovido mundos de água na noite anterior, logo, a Rua da Moeda estava parcialmente inundada. Um pequeno dilúvio. Ainda bem que era à tarde; de manhã a situação devia estar pior ainda.

Se ele fosse por ali, talvez saísse na Rua da Aurora...

Foi então que ele viu. Não entendeu como viu aquilo, pra começo de conversa, já que estava olhando pra cima, não pro chão, atrás daquela árvore enorme no meio da rua inundada. Mas ele viu.

Tinha um brilho singelo, devido ao sol e à água, e estava meio solto, rolando de um lado para o outro, de um lado para o outro... Era um orbe de cristal. É claro, para Fernando, uma "bolinha de vidro", mas quem se importa com nomenclaturas?

Ele simplesmente se abaixou e pegou o objeto. Fernando não é do tipo que sai por aí apanhando coisas no chão, principalmente coisas dentro d'água, cuja pureza é altamente questionável. Mas ele inclinou-se e pegou o pequeno orbe.

A luz do sol continuou brincando em sua superfície, refletindo-se em seu rosto. - Mas que merda...?

Fernando não era muito poético.

Ouviu um barulho muito alto. Parecia madeira caindo, e com o susto, largou o orbe, que esparramou água e espatifou-se no chão. Mas ele ficou apenas olhando na direção do barulho.

- Oi? Tá tudo bem aí?

- MARIANA, MARIANA, VOLTA PARA MIM!

Fernando deu um passo atrás, apavorado, sem entender nada. O primeiro problema era que a luz do orbe continuava a cegá-lo parcialmente - e ele tinha certeza que o negócio tinha quebrado. O outro problema era que aquela voz vinha do além. Fernando não conseguia definir de outra forma. Era uma voz do além, parecia vir de todas as direções.

Ele olhou para os cacos no chão. E descobriu que havia um papel dentro do orbe, agora exposto à água.

Rapidamente, ele apanhou o papel e saiu correndo dali, fosse para a Rua da Aurora, do Sol, do Diabo, não importava. O importante era sair dali. E rápido.

E isso tudo porque ele não acreditava em assombração.