Últimmas Folhas

30 de setembro de 2008

Casca-de-Coqueiro

CASCA-DE-COQUEIRO

I. P. Araújo

Esta história que vou contar não aconteceu há muito tempo atrás, nem tampouco numa terra muito, muito distante. Essa história aconteceu exatamente aqui, onde você está, e não deve ter-se passado há muito tempo atrás, pois quem me contou estava vivo e lúcido, por mais absurda e mentirosa que possa soar. De minha parte, abstenho-me de julgamentos. Não digo que é de todo verdade, nem que é de todo mentira, mas posso dizer que é a mentira mais verdadeira que um dia você poderá ouvir.

É a história de um pescador, homem simples que nunca se preocupou com nenhuma grande questão do universo, mas que estava bastante satisfeito em apenas viver nele, e que andava pela praia, solitário, numa noite de lua plena. Todos os outros pescadores já se haviam recolhido, mas ele continuava lá, só, vagando pela areia branca.
Não havia nenhum real motivo para fazê-lo; o simples prazer de caminhar à noite já lhe era um bom motivo. Num dos ombros nus, ele apoiava uma vara, e no outro, uma cesta. Seu nome era Manuel, e morava sozinho com a avó velha numa das casas da aldeia de pescadores. Perambulando pela noite da praia deserta, foi difícil ouvir os sussurros que invadiram o ar ao seu redor. Não passava de um murmúrio suave, que vinha bater em seus ouvidos de acordo com o vento. Dizia algo indistinguível, mas ao mesmo tempo belo.
O peito do pescador se rebentou em curiosidade e amor por aquela voz que soava como ondas e vento, e saiu a persegui-la. Estava fascinado, encantado com a voz inumana que suspirava pela praia, ora contra o vento, ora seguindo-o. De uma forma ou de outra, o pescador alcançou o lugar de onde pareciam vir os suspiros e murmúrios. E, para sua completa surpresa, aquela voz de sereia vinha de um tronco opaco de coqueiro.
Era o coqueiro mais alto da região, que rangia quando o vento batia e sussurrava com sua copa verde lá no alto.
Podia ser a noite, ou o cansaço, ou mesmo os dois unidos, mas o homem teve a certeza de ver no tronco da árvore, um metro acima da sua cabeça, dois olhos negros como besouros piscando para ele. A palha do coqueiro balançou, e sussurrou com a mesma voz feita de areia, onda e vento que ele ouvira antes. Mesmo a essa proximidade, o som não passava de um murmúrio indefinido e musical.
Seu coração bateu mais forte ainda, e ele não titubeou em falar:
– Fala comigo, Coqueiro.
E, para seu completo espanto, uma voz, tão melódica e táctil quanto o próprio vento, respondeu:
– E quem vem falar-me?
Suas pernas tremeram, e o cesto e a vara tiveram seu repouso na grama esparsa que crescia na areia branca. Apesar de ter falado, o pescador não esperava verdadeiramente que seu chamado fosse respondido. Não conhecia dos mistérios do mundo, mas conhecia o Pai de Santo da região, e sabia que este não acharia sábio hesitar diante de um chamado assim.
– Manuel.
– E o que Manuel quer com um Coqueiro?
– Ver o rosto de uma santa.
Algo como um riso reverberou no coração enfeitiçado do pescador, e ele ouviu:
– Pois só você me chama santa.
– Mas é uma santa quem fala.
– Quem fala é o coqueiro.
No instante seguinte, um metro acima de sua cabeça, surgia o rostinho pequeno e redondo de uma menina, seguido de um pescoço, ombros, braços, tórax e pernas. Logo, a menina do coqueiro abria os braços na direção do pescador no chão, como se pedisse para ser carregada. A casca do coqueiro segurava seu longo cabelo, e ela teve que lutar contra a árvore para libertá-los, assim como havia lutado pelo resto do seu corpo.
Ele ergueu os braços e segurou a menina, até ela estar a salvo no chão, com seus pés de casca de coqueiro enterrando-se na areia branca. – Eu moro no coqueiro.
– Eu sei.
– E não sou gente feito você.
– Sei também disso.
– Saber demais cansa. Quero conhecer os homens, leve-me até eles. – Não era um pedido.
Os olhos da menina do coqueiro eram negros como dois besouros, os mesmos olhos que haviam olhado-o de dentro do tronco da árvore; seu cabelo, verde e viçoso como a copa do coqueiro; seus braços e pernas tinham a mesma textura e cor do tronco de sua árvore-mãe; e de sua boca saiam mariposas e vento quando falava com o pescador. Pequena como só ela, era tão assustadora quanto o coqueiro que se estendia soberano acima dos homens. Seus olhos refletiam a lua, e seu cabelo murmurejava com o vento.
– Você é feita de casca e bichos, os homens vão fugir de você.
A menina percorreu os olhos pela praia deserta, olhou o próprio coqueiro, que havia perdido seu viço quando ela o deixara, e depois o mar e enfim o homem.
– Está certo. Os homens não gostam de casca e bichos – caminhou até a beira do mar, de forma que molhasse os pés de casca seca com a água salgada. Fechou os olhos-de-besouro e abriu-os novamente: – Você deve cobrir-me com areia exatamente aqui, e velar por mim até o primeiro raio de sol me atingir, que me cobrirá com a casca de que é feito o homem. Depois, você lançará sua linha no mar e pescará o maior peixe que você já viu, e irá abri-lo. Dentro dele, você encontrará meu vestido de algodão. Deve vestir-me e, aí sim, irei ver os homens.
A voz dela era feita de alguma coisa que o pescador jamais ouvira antes. Parecia conter a textura de uma alga, o movimento das ondas e nenhuma dessas coisas, mas algo mudo que vibrava mais no seu peito do que nos seus ouvidos.
– Seria uma honra – foi o que disse.
– Mas atenção, pescador. Não use isca alguma, pois o peixe pode se ofender e arrastá-lo com ele até um túmulo aquático. E ao cortar o peixe e tirar meu vestido, você deve colocar três conchas em sua barriga e lançá-lo ao mar de novo.
O pescador, pela primeira vez, incomodou-se com o que ouviu aquela voz de sonho dizer:
– Mas um peixe morto!
A menina virou-se para ele, de forma tão vagarosa quanto um coqueiro se curva ao vento. Olhou-o com aqueles olhos que refletiam a lua e disse:
– O peixe nunca morre. Sua espinha costura nas conchas meus vestidos de algodão.
E deitou-se na areia branca, de olhos fechados, esperando que Manuel cobrisse seu corpo de casca de árvore com a areia. E ele o fez. Logo, nem os cabelos verdes podiam ser vistos, e os olhos fechados mais pareciam duas conchas milenares que jaziam na areia. E ele velou por ela a noite toda.
De madrugada, sua cabeça titubeava em permanecer ereta, mas ele se apoiava na própria vara e se obrigava a continuar desperto. A menina coberta de areia ao seu lado não levantava um suspiro sequer, e por algum tempo, o pescador achou que ela estava morta. Ela não respirava, e de cima dela, nenhum grão de areia caiu.
O céu finalmente começou a mudar de cor. Primeiro o azul arroxeado, depois o laranja-lilás, e por fim o primeiro raio de sol banhou o monte de areia onde se encontrava a menina feita de casca de coqueiro. E ela fez o primeiro movimento: mexeu a cabeça, despejando de sua tez – agora morena – a areia branca que lhe escondia. Os cabelos se revelaram castanho-queimados, e só os olhos negros ainda lembravam ao pescador que ela era a menina feita de casca com olhos de besouro.
– Pesque-o – foi o que ela disse, ao fitá-lo com aqueles olhos enormes e negros como a boca da noite.
O pescador levantou-se, vara em punho, e após entrar na água do mar até ter água na altura dos joelhos, lançou a linha. O nascer do sol dificultava sua visão, mas ele persistiu. O peixe que viria até ele. O que Manuel não sabia era se teria forças para puxar algo tão grande quanto a menina do coqueiro dizia que era.
E assim, com medo, ele esperou.
E uma hora se passou, e mais outra, e outra. E ele permanecia ali, imóvel e assustado, esperando um puxão brutal do outro lado da linha a qualquer momento. Cansado, ele se permitiu olhar para a menina deitada, ainda meio coberta de areia.
– Não fique com medo. O medo o espanta. Não fique com medo.
O pescador não poderia dizer se a voz que ouvira saíra dos lábios da menina, de sua própria cabeça ou das ondas que batiam suaves em seus joelhos. Mas ele obedeceu-a, e fechou os olhos, tranqüilizando-se. Ouvir o sussurro daquela voz já era, por si só, tranqüilizante. E tão logo ele abriu os olhos, já calmo, sentiu um puxão na linha. E ele revidou.
Continuou puxando e puxando, imprimindo na vara toda a sua força, arrastando o peixe para mais perto da praia... Não precisou puxar muito para que o Grande Peixe ficasse fora d’água: ele era tão grande que já estava com metade do corpanzil escamoso para fora no mesmo lugar em que Manuel estivera.
Ele correu até o peixe, que ofegava, e cortou sua barriga, no que a criatura se debateu e jogou água há metros de altura. Suas vísceras saltaram para fora, junto com sangue e cheiro de peixe cru.
Respirando fundo, o pescador enfiou os braços na barriga aberta do peixe, até os cotovelos, e finalmente sentiu um tecido macio na ponta dos dedos. Com rapidez, ele puxou o vestido de dentro do peixe, tirou as três conchas que havia guardado no bolso e enfiou-as na barriga sangrenta. Nesse momento, o animal se debateu, virou de lado e sumiu na água, com a mesma rapidez com a qual aparecera. E o pescador continuava ali, parado na água, com um vestido de algodão cru nas mãos. Estranhamente, parecia tão limpo como se tivesse acabado de ser feito. Ele não sabia se havia sido a água do mar que limpara a sujeira, mas não havia nem sinal de sangue ou vísceras ali.
Voltou-se novamente para a praia, e entregou o vestido à menina, que ao vesti-lo mais parecia uma santa que uma menina. Aquele era o vestido mais estranho que o pescador já vira: tinha a textura de uma pétala de flor, e era tão branco como uma pluma de gaivota.
Ela levantou-se e olhou-o, esperando.
– Por aqui – respondeu ele, sem esperar a pergunta.
A menina acenou com a cabeça e seguiu o pescador. Eles caminharam lado a lado, em silêncio. Ela, sob o olhar furtivo e encantado do pescador; e ele sob a implacável decisão dela de conhecer os homens. Por meia hora, eles andaram, até que enfim chegaram à vila de Manuel. Era tão pequena quanto ele havia descrito à menina do coqueiro, mas ela parecia tão curiosa quanto uma formiga dentro de um pote de açúcar.
A princípio, os outros homens estranharam a menina de olhos negros e passos tão implacáveis – implacáveis demais para uma simples menina –, mas Manuel os convenceu de que não passava de uma filha de um primo distante que morava na cidade. Quando indagada sobre sua bagagem, quem respondeu foi o pescador:
– Perdeu-se na viagem.
E quando indagada sobre seu nome, ela mesma respondeu:
– Casca.
Durante todo aquele dia, os homens e mulheres da vila de pescadores não pararam de olhar, curiosos e fascinados, para a recém-chegada. As moças viam nela os cabelos mais brilhantes e macios que se pode imaginar, e os homens ficavam encantados e assustados com seus olhos negros, como dois besouros numa noite sem lua, como ilustrou um deles. Manuel mostrou as casas, as pessoas e seus nomes, seus objetos. E ela ouvia tudo com silenciosa atenção, balançando a cabeça ou meramente desviando o olhar – como fez para o machado de um dos homens.
Na hora do almoço, ela comeu em silêncio, mariscos, arroz e toda a sorte de comida que podia haver por ali. Demonstrou uma curiosidade particular para com os cocos, como se não entendesse o que os homens faziam com eles. Algumas crianças brincavam com cocos secos, e outras tantas ainda tomavam a sua água. Uma artesã fabricava enfeites para vender.
E assim ela passou toda a tarde com Manuel, visitando cada casa da vila de pescadores, conhecendo cada casco de cada barco que cada pescador ali tinha. No final da tarde, ela virou-se para Manuel, deitado numa rede, e disse:
– Está bem. Já aprendi tudo que tinha para aprender.
O pescador ergueu-se da rede e fitou aqueles olhos assustadores.
– Tudo?
– É muito simples; agora eu vou.
– A vila é nada comparada ao resto do mundo dos homens, Casca – interferiu Manuel, levantando-se da rede. – Há tanta coisa lá fora que você nem imagina. Tanta gente, tanta complicação, tanta coisa diferente do que tem aqui.
– Não importa. É tudo igual no fim.
Ela levantou-se e olhou para alguns homens, que agora acendiam uma fogueira um pouco mais afastada da vila.
– Vai haver uma festa hoje à noite – declarou o pescador, o peito apertado pela ideia de se despedir daquele ser encantado. Casca levantou-se.
– Fique, quando a festa acabar, eu a levo de volta ao seu coqueiro.
E após um breve silêncio, ela concordou.
O sol sumia no horizonte, criando sombras fantasmagóricas dos irmãos e irmãs coqueiros de Casca, que parecia entender os sussurros das árvores no vento.
Ele guiou-a até a grande fogueira que havia sido preparada, e para onde todos os outros homens e mulheres da aldeia haviam ido, e puxou um instrumento de corda e começou a tocar. A menina observava, quieta, o ritual daquelas pessoas: algumas dançavam, todas cantavam e outras tantas tocavam instrumentos de madeira. Havia comida: peixes, frutas, especiarias que Casca não entendia. Aquelas pessoas pareciam nunca se cansar de dançar e gritar, e giravam e giravam com o vento, levantavam areia, riam, davam-se as mãos e dançavam juntas, faziam um grande círculo – e giravam um pouco mais.
Casca, por sua natureza, permanecia estática a um canto, apenas observando. Ora ou outra o pescador a olhava, mas ela estava tão absorta que ele tinha medo de chamá-la. Depois de um tempo, ele próprio largou o violão e foi dançar na roda. E girou como todos os outros, contra o vento, fazendo barulho, rindo, levantando areia.
A festa durou até a madrugada, quando o sol ameaçou despontar no mar e fazer os restos da grande fogueira inúteis. A grande maioria já havia ido para casa, e agora alguns poucos bêbados dormiam ao relento. Casca, que permanecera em pé a festa toda, aproximou-se do pescador, que cochilava com a cabeça apoiada num tronco. – Agora eu vou.
Com certa dificuldade, o pescador levantou os olhos para a menina encantada. Ele fitou seus olhos pretos como breu e estremeceu, acordando rapidamente. Ao seu redor, os restos da festa iam-se esvaindo com o dia. Ele levantou-se, limpou a areia e perguntou: – Você não pode ficar?
– O pescador acha que uma árvore poderia dançar, correr e caminhar contra o vento?

Eles chegaram ao coqueiro de Casca-de-Coqueiro antes que o sol surgisse por completo no horizonte, e ele parecia menos vivo agora, sem sua alma. A menina rodeou a árvore e tocou-a com a ponta dos dedos. Parecia pálida agora, tão fraca quanto o coqueiro.
O pescador estava inconsolado. Perder aquela criatura magnífica, que ele sabia que jamais veria de novo, e nem qualquer outra de sua espécie, dilacerava seu coração. Os outros coqueiros pareciam sussurrar e chamá-la pelo nome, e o pescador, impressionado, pôde ver naquelas cascas secas e duras rostos de meninas e meninos, fitando-o com os mesmos olhos negros de Casca-de-Coqueiro. Por um instante, ele pestanejou, e os rostos desapareceram. A pequena menina voltou-se novamente para ele e segurou sua mão. “Obrigada”. Ela voltou-se novamente para seu coqueiro, e com os braços abertos, apertou-se contra o caule. Aos poucos, seu vestido branco dissolveu-se, e virou areia, e a menina voltou a ter a pele de casca de coqueiro de antes. Só seus olhos não mudaram. Então ela fechou-os, e voltou para casa.
– Pra quê essa viagem? –, o pescador ainda ousou perguntar.
– É para um julgamento – ele ainda ouviu aquela voz feito um sopro responder, e estremeceu.
O pescador, ao final do dia, finalmente foi para sua casa, pois o passou ali sentado sem descansar. A lembrança era mortiça e o dia anterior parecia-lhe um mero sonho. Ao seu lado, sua vara e sua cesta, como se ele nunca tivesse chegado na aldeia. No peito, a dor e a saudade. E na mente a imagem da mais bela criatura que já vira.

1 de setembro de 2008

O Medo

O MEDO

Quando eu era criança, tinha medo de tudo. Qualquer coisa me aterrorizava. Tinha medo de ladrão, de bala, de briga, de escuro, de fantasma. Tinha medo de me perder. Tinha medo até de dizer a coisa errada na hora errada. Tinha medo de apanhar, também. Tinha medo de nunca mais ver minha mãe quando a gente se separava, pelo motivo que fosse. Tinha medo até do batuque do maracatu do lado da minha casa. Tinha muito medo. Meu coração acelerava no ritmo da música, e eu ficava apavorado. Tinha tanto medo, mais tanto medo, que fiquei com mais medo ainda de sempre ter medo. Porque se eu sempre tivesse medo, então eu não ia poder fazer nada, eu pensava. Porque eu realmente não fazia nada, e eu sabia disso. Mas todos os meus medos pareciam – ou melhor, eram – reais. Eu tenho o direito de ter medo, eu pensava. Mas às vezes ficava frustrado por nunca conseguir fazer nada.

Um dia o medo foi-se embora. Assim, como se fosse uma vela e eu a tivesse apagado.
Foi numa noite que juntou todos os meus medos num único pesadelo de alguns minutos – tinha o batuque do maracatu, o escuro, uma briga, dois ladrões, quatro balas e um fantasma.

Foi nessa noite também que eu disse a coisa errada, apanhei, me perdi e nunca mais vi a minha mãe.



Era janeiro. O carnaval estava chegando. Do lado da minha casa eles ensaiavam todos os dias, incansavelmente. Meu coração batia acelerado no ritmo dos tambores, como se fosse parte do ensaio. Era noite e estava muito escuro, só a TV estava ligada. A gente não podia gastar muita luz, então quase não acendia as lâmpadas.

A janela tava aberta. Era outra coisa que eu tinha medo – da janela aberta. Qualquer coisa podia entrar por aquela janela: bicho, fantasma, gente. Minha mãe dizia que eu não precisava ter medo – bicho a gente espantava, fantasma a gente dava reza e gente não ia querer roubar uma casa tão pobre. Eu quase acreditei nela.

Mas naquela noite, alguma coisa entrou pela janela. Era gente, de carne e osso, mas antes não fosse. Dois homens, muito altos na minha visão de menino, um deles com uma pistola na mão. Nem deu pra pensar direito.

Eu gritei, e um deles me deu uma bofetada. Minha mãe me ouviu – antes não tivesse ouvido! – e correu pro meu quarto. Levei outra tapa e caí no chão. Minha mãe chegou na porta.

Quatro tiros.

Minha mãe deitada no chão. O fantasma dela invisível pra mim.

Corri pra fora de casa. Nunca mais voltei, me perdi na rua.

E também perdi meu medo.